20ª Carta de Infraestrutura

Inter.B Consultoria Internacional de Negócios

Data de publicação Abril de 2021

Ferrogrão: um projeto viável?Ano VIII, n. 20

Autores: Cláudio Frischtak e Renata Canini  

Prezado (a) Leitor (a),

A Inter.B tem o prazer de disponibilizar a 20ª edição da Carta de Infraestrutura, e cujo foco é possivelmente o maior projeto greenfield do setor ferroviário no país – a Ferrogrão – no momento sendo analisada pelo Tribunal de Contas da União (TCU).

 

De forma sintética, há problemas de 3 ordens distintas em relação a esse projeto. Primeiro, é um projeto que não se sustenta financeiramente. Sob qualquer conjunto de premissas razoáveis em termos de gastos de capital (capex), tempo de implantação e tarifa a ser cobrada, as taxas de retorno são extremamente baixas, não cobrindo o custo de capital de investidores privados. Exatamente por conta disso, o governo se propõe a absorver os riscos do negócio numa magnitude em aberto, replicando projetos privados de infraestrutura que acabaram por demandar volumes expressivos de recursos públicos para se viabilizar. Ademais, a modelagem da futura concessão da BR-163 – rodovia já em operação e que corre paralelo ao traçado da Ferrogrão – é direcionada para reduzir a concorrência desta rodovia com a futura Ferrogrão, o que obviamente prejudica os usuários e o país.

 

Segundo, o projeto tem um impacto muito relevante sobre o bioma amazônico. Ainda que a Carta não tenha por foco as dificuldades de natureza ambiental associadas ao projeto, e que não são poucas, o fato é que a construção de 933 km (mais 2 ramais) de uma ferrovia num bioma sensível, 72 km dos quais atravessando o Parque Nacional de Jamanxim, é um desafio de primeira grandeza, e para o qual o projeto ainda não tem resposta. Pelo contrário, como a Carta aponta, há elementos que sugerem a impossibilidade de avançar o projeto sem mudanças significativas no traçado. Na realidade, não há um projeto básico crível, e muito menos um projeto executivo. Consequentemente, os números apresentados ao TCU, e as soluções propostas para uma obra de tal complexidade, são distantes do que se poderia esperar para um empreendimento que se propõe ser objeto de concessão em 2021.

 

Finalmente, há a convicção da importância de o país ampliar os investimentos em infraestrutura, assim como melhorar sua qualidade. Nesse sentido, é essencial uma boa governança que, de um lado, impeça projetos inferiores e com baixas taxas de retorno social avançarem, e inversamente, promova bons projetos, que no âmbito da logística de transportes, atendam às necessidades de reduzir os elevados custos de logística no país, ampliar a competitividade, e promover o desenvolvimento sustentável. Conforme a Carta sugere, a Ferrogrão não é um desses projetos. Há formas mais produtivas e eficientes de alocar os recursos escassos do país; estas devem guiar os esforços do poder público.